Estrutura do Servir

Um trecho do livro Outra Espiritualidade, de Ed René Kivitz, diz:

“O serviço cristão acontece, portanto, não quando os cristãos estão mobilizados, organizados e atarefados, mas quando estão juntos, atentos uns aos outros. Isso implica a cobrança muito maior sobre as pessoas do que sobre as estruturas. Em outras palavras, devemos substituir as expressões ‘ministério de cuidado do rebanho’ ou ‘ministério de assistência social’ por cristãos que se aconselham e suportam mutuamente e cristãos solidários capazes de levantar do sofá e visitar o irmão desempregado. Enquanto as pessoas acreditarem que a responsabilidade do serviço está nas mãos do ministério disso e daquilo, a coisa continuará emperrada. Pessoas são responsáveis por pessoas. Para que cumpram suas mútuas responsabilidades, precisam estar perto umas das outras.”

O texto me fez relembrar do evangelho de Jesus, de sua missão que foi puramente relacional, como Paulo disse em Filipenses 2:4-6: “seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se”. Esse texto é de simples compreensão e não nos deixa espaço para divagar, mesmo que alguns o façam.

Hoje, mesmo a igreja sendo uma organização, ela não precisa funcionar igual a uma corporação de executivos que terceiriza o trabalho de Deus, que acha melhor contratar profissionais vocacionados e capacitados para abençoar seus filhos (clientes) mimados e exigentes, que a qualquer momento pode encontrar um ‘deus’ melhor e que atenda a suas necessidades imediatistas.

Trabalhar em uma estrutura hierárquica, seja ela linear (relação comando-subordinação), ou funcional (para cada função tem um chefe), ou matricial (poder dividido para mais pessoas) é bem mais fácil. Sabemos a quem devemos cobrar e a quem culpar por qualquer acontecimento, pois as responsabilidades são exatamente definidas no momento de sua contratação. A hierarquia, classificação ordenada dentro de qualquer grupo ou corporação, geralmente de acordo com o poder, autoridade ou função, é bem pragmática e metódica.

O modelo empresarial de hierarquia vertical é metódico e engessa as atividades, já o modelo horizontal é bem mais flexível, dinâmico e muito mais próximo das pessoas para quem são direcionados (os clientes). Uso esses termos de gestão somente para que possamos compreender a questão pelo viés técnico.

Contudo, o foco é entender que quando falamos em Reino, falamos em relacionamento. Não de achar que sua função, seus dons e seus talentos são mais importantes do que os do seu próximo; não é sobre decidir quem manda, se é você ou a outra pessoa, mas entender que somos um só corpo em Cristo. É simples. Fico até triste quando nos submetemos a uma pseudo-hierarquia espiritual que engessa o crescimento do Reino, aproximando as pessoas da estrutura corporativa da igreja e suas programações, regras e moral distorcida.

Gosto quando dizemos que temos uma hierarquia horizontal em que as mudanças acontecem, em que todos podem participar, em que as pessoas opinam e realmente são escutadas de forma relevante, em que o conhecimento de cada um é valorizado e aquele trabalho é algo realizado em conjunto como um só corpo. Parece utópico? Mas não é.

Os cristãos estão já catequizados com essa idéia hierárquica linear e isso os tem acomodado em seus papéis definidos. Cada reunião serve para definir quem serão os líderes, porque os outros serão apenas liderados (isso não acontece na ABU, certo?!), ou seja, farão aquilo que o “ungido” disser e se ele não disser nada então ele será o culpado de tudo que isso resultar.

Jesus nos ensina exatamente o contrário, não simplesmente em suas palavras, mas em sua caminhada, em seus relacionamentos com os discípulos e com aqueles que deixavam tudo para segui-lo. Para explicar isso biblicamente nada melhor do que entender quando Jesus passa por Samaria e conversa com aquela mulher samaritana (João 4:1-28), ele surpreende ao falar com quem os judeus repudiavam (alguém de Samaria) e ainda mais, uma mulher. Mas Jesus se achega, conversa, cria um ambiente favorável e agradável e, depois disso, ele a envolve em uma intimidade que a faz crer e entender que aquele é o Cristo.

Entender as estruturas na gestão contemporânea é interessante, mas entender o Reino, percebê-lo e vivê-lo é bem mais importante e passa pelo saber que Jesus foi o Rei Servo, aquele não que foi menor do que nós, seres humanos, suas criaturas, mas ainda assim se fez carne e habitou entre nós para mostrar a formosura do Reino.

 

Hellenilson Mota

É presidente da ABU Teresina

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